Quando em 2006, o matemático britânico Clive Humby disse «Data is the new oil», ele quis dizer que os dados, tal como o petróleo, devem ser refinados e transformados para que se tornem produtos e serviços úteis.
Só então é que se tornam valiosos.
As pessoas esquecem-se de que apenas dados relevantes e acionáveis são valiosos.
Muitos dos dados recolhidos são métricas de vaidade (Likes ou Gostos) ou até mesmo palha totalmente irrelevante, muitas vezes contaminados com fraude e spam.
O custo de oportunidade da sua recolha e análise supera qualquer valor residual, é por isso que nas minhas formações de marketing insisto na jornada do cliente e na importância de, na fase de captação de contactos, qualificarmos bem os contactos.
Mesmo quando se tem dados sólidos e modelos preditivos de alta qualidade, isso não significa que se possa realmente explorar essa informação para atingir objetivos comerciais.
A Apple (NASDAQ:AAPL) traçou recentemente uma linha, dizendo que os dados do utilizador são propriedade do utilizador, enquanto o Facebook (NASDAQ:FB) luta para manter o seu livre acesso a esses dados, permitindo assim aumentar as suas vendas aos anunciantes.
A questão da propriedade dos dados do utilizador é importante.
E o que dizer sobre o seu controlo?
- Será que a pessoa ou a empresa que recolhe dados tem o direito de controlar o que é recolhido e como é utilizado?
- A empresa tem a obrigação de utilizar os dados que adquire sobre os utilizadores apenas para o seu benefício ou é livre de os utilizar contra eles?
- É livre de os tratar como um bem a ser revendido sem qualquer benefício incremental para o utilizador de quem foram recolhidos?
Em 2019, o Facebook tinha cerca de 71 mil milhões de dólares em receitas, com os quais a empresa obteve cerca de 18,5 mil milhões de dólares em lucros.
Ganhava o seu dinheiro servindo anúncios direcionados a cerca de 2,5 mil milhões de utilizadores mensais ativos. A nível mundial, a receita média anual do Facebook por utilizador (ARPU) foi de cerca de $29,25.
O Facebook não comunica lucro por utilizador (por vezes chamada de margem média por utilizador, ou AMPU), mas dado que a margem de lucro do Facebook era de cerca de 26% da receita, podemos estimar que o seu lucro médio anual mundial por utilizador era de cerca de $7,50.
Os números são consideravelmente mais elevados se olharmos para a Europa (AMPU anual de $11,48) ou para a América e Canadá (AMPU anual de $36).
Somos mesmo os donos dos nossos dados?
É difícil argumentar de forma convincente que os clientes do Facebook não obtêm valor com a utilização dos seus serviços.
É muito rentável para as marcas, considerando as oportunidades de segmentação.
Mas a matemática é ainda mais convincente para uma empresa como a Google (NASDAQ:GOOGL), uma vez que oferece muito mais nos serviços gratuitos.
Tim O’Reilly, CEO da O’Reilly Media, estimou, de acordo com os dados que a Google fornece, que a sua ARPU em publicidade foi de cerca de $266 em 2020.
Dada a margem de lucro líquido da empresa de 22%, o seu AMPU dos EUA parece ser de cerca de $59. Isso é quase o dobro do Facebook.
Se os utilizadores reclamassem um quarto desse lucro, pelo facto de a empresa fazer uso dos seus dados para receita, estaríamos a falar de apenas $15 de valor anual – $1,25 por mês – para pagar aos utilizadores pelos dados que utiliza.
Parece irrealista?
Já foi tentado.
- Peoople: uma espécie de Pinterest (NYSE:PINS), onde pode guardar e agrupar várias imagens. As suas recomendações valem dinheiro consoante o número de interações que geram.
- Minds.com
- Redgage
- Youtube: Todos sabem que o Youtube tem o seu próprio sistema de monetização, onde as pessoas partilham o seu conteúdo e recebem pagamento da rede social.
O mercado vai evoluir para os benefícios dos dados partilhados, porque as pessoas estão dispostas a abdicar da sua privacidade em troca de serviços.
Até aqui explorei duas premissas:
- Será que os utilizadores não deveriam receber dinheiro por ser a razão da enorme valorização das Big Tech que lucram que os dados dos utilizadores?
- A permuta de acesso a serviços em troca dos dados pessoais.
O que pouca gente está à espera é de pagar para usar uma rede social.
Para finalizar, os esforços para concentrar a conversa à volta da privacidade como uma solução, é importante, mas está condenada ao fracasso, porque as pessoas vão continuar a aderir a serviços sem ler termos e condições, a fazer chamadas telefónicas de 1€ para serem uma das vencedoras, em milhões de ligações, de recompensas fáceis, em troca consentida dos seus dados pessoais.
Quando abordamos os danos reais a que as pessoas estão expostas quando desistem da discriminação, radicalização ou concorrência desleal dos seus dados – talvez haja a hipótese de fazer alguma diferença.