LISBOA, 30 Jan (Reuters) - Este é um conjunto de perguntas e respostas da entrevista a Pedro Caupers, administrador executivo da Sonae Sierra (SA:SSBR3), que quer continuar em 2018 o forte ritmo de aquisições em Portugal e no exterior.
Pedro Caupers alertou, contudo, que agora as oportunidades são mais raras dada a subida global dos preços do imobiliário. ID:L8N1PL34F
A maior gestora portuguesa de centros comerciais e de activos imobiliários, muito diversificada internacionalmente, também quer 'navegar' a dinâmica do mercado, 'reciclando' capital ao vender activos vistos como tendo menos potencial.
REUTERS: A confiança dos consumidores em Portugal está em máximos e a economia portuguesa entre as que mais expandem na zona euro. Como é que a Sonae (LS:YSO) Sierra avalia o actual momento macro nos principais países onde está, nomeadamente Portugal?
PEDRO CAUPERS: As nossas perspetivas de evolução dos indicadores económicos nos principais mercados europeus onde estamos presentes são positivas.
Embora haja cenários políticos e económicos em aberto, como as consequências do voto do Reino Unido para abandonar a União Europeia, a incerteza na Catalunha ou as eleições em Itália, em março, a nossa expetativa é de que o mercado europeu continue a crescer durante 2018.
Aliás, a evolução do mercado de investimento na Europa - nomeadamente em Portugal e Espanha - também teve um impacto muito positivo na valorização do nosso portefólio nos últimos anos (registámos um OMV de 7 mil milhões em 2016, contra 5,7 mil milhões em 2013) criando condições favoráveis para que concluíssemos com sucesso algumas aquisições e alienações.
Estas operações são consistentes com a nossa estratégia de reciclagem de capital e têm permitido à Sonae Sierra continuar a inovar e a desenvolver o seu modelo de negócio como operador de referência no setor do retalho imobiliário.
REUTERS: Olhando para o sector em específico, quais vê como os principais riscos e oportunidades, quais as geografias mais atractivas?
PEDRO CAUPERS: De uma forma geral as perspetivas para mercados emergentes como o Brasil, Rússia, Índia, ou até mesmo a China que tem ultrapassado as expetativas, permanecem favoráveis, com o retalho a registar um crescimento significativo, motivado pelo crescimento da classe média, pela expansão do crédito ao consumo e pela procura de espaços modernos de retalho.
Em 2030, o PIB do E7 (os sete maiores países emergentes: China, Índia, Brasil, Rússia, Indonésia, México e Turquia) já terá ultrapassado o do G7 (os sete países mais desenvolvidos: Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá).
Relativamente aos mercados emergentes onde estamos presentes, esperamos que a Colômbia mantenha a tendência de crescimento, e se mantenha atrativa para novos retalhistas.
Quanto ao Brasil, podemos afirmar que 2017 já foi uma ano de lenta recuperação, visível por exemplo no crescimento interessante registado nas vendas dos lojistas dos Centros que temos em operação neste mercado.
A Turquia, embora sendo um mercado importante com um significativo crescimento do retalho nos últimos anos e um forte potencial de futuro, continua assoberbada com preocupações de segurança e com um conflito envolvendo as suas fronteiras.
No Norte de África, a numerosa população da Argélia, a baixa presença de espaços de retalho e o PIB per capita em comparação com outros países da região conferem grande potencial de investimento a este mercado, embora os riscos económicos e políticos permaneçam.
Por outro lado, o vizinho Marrocos oferece mais segurança: ao investimento em infraestruturas e ao crescimento do turismo soma uma população cada vez mais próspera, com uma estrutura etária jovem comparativamente com os padrões europeus, bem como a presença já consolidada de numerosos retalhistas internacionais.
Na Roménia, o crescimento acelerado do PIB está a suportar um aumento continuado do consumo impulsionando o desenvolvimento de centros comerciais e a entrada de novos retalhistas internacionais.
Nos mercados Europeus mais maduros, os investimentos em novos projetos de raiz têm sido limitados, mas o apetite dos investidores permanece forte.
Tendo em conta as competências e a grande experiencia da Sonae Sierra nos vários domínios da promoção imobiliária, estamos a adaptar-nos com confiança ao desenvolvimento de projetos não exclusivamente de retalho (mixed-use) e continuamos atentos às oportunidades que nos permitam alargar o nosso negócio de serviços profissionais prestados a terceiros.
Estamos firmemente convictos que os ativos de retalho têm de ser inspiradores em termos de conceito, oferecendo um equilíbrio entre compras, serviços e experiências, construindo relações emocionais com os seus visitantes. Acreditamos também que uma boa integração nas comunidades é muito importante para garantir o sucesso dos projetos a longo prazo.
REUTERS: Vê o actual momento como particularmente propício a dinâmicas de M&A no sector? A Sonae Sierra vai ser compradora?
PEDRO CAUPERS: Existe atualmente uma grande procura por ativos imobiliários e o volume de investimento tem atingido máximos históricos, em vários países. Estamos agora na fase favorável do ciclo do mercado imobiliário e o interesse dos investidores no mercado de Portugal e Espanha não pára de crescer. Há mais (e melhor) investimento e consequentemente os ativos valorizaram.
Neste contexto, e sendo a Sonae Sierra um player ativo no mercado, poderemos assumir posições compradoras ou vendedoras, dependendo das oportunidades específicas e do ciclo de investimento, em cada momento. Claramente, não vamos vender os nossos ativos mais core, ou seja, "as joias da coroa", onde existem ainda muitas oportunidades de criação de valor, nomeadamente através de expansões, remodelações e melhorias do tenant-mix, a exemplo do que iremos fazer, por exemplo, no Colombo ou no Norteshopping.
REUTERS: Quais são as 'traves-mestras' da estratégia de gestão de portefólio dos centros comerciais actualmente? Em que pressupostos assentam?
PEDRO CAUPERS: Em grandes linhas, a estratégia que delineamos na Sonae Sierra baseia-se na rotação de ativos: isto é, desinvestimos em ativos com menor valor estratégico ou com poucas oportunidades de criação de valor no longo prazo, para investir em ativos de maior relevo no nosso portefólio e onde existam oportunidades de melhoria e de criação de valor.
Um claro exemplo desta estratégia é o investimento no primeiro Outlet de marcas de luxo do sul de Espanha - o McArthurGlen Designer Outlet Málaga, que ascende aos 140 milhões e conta com 30.000 m2 de ABL (Área Bruta Locável). Resulta de uma parceria com a McArthurGlen, líder na Europa em propriedade, desenvolvimento e gestão de designer outlets.
A primeira fase contempla uma área de 17.500 m2 de ABL para cerca de 100 lojas e tem abertura prevista no final de 2018.
Desta forma, desde 2008 que a Sonae Sierra tem vindo a implementar uma estratégia de reciclagem de capital, que consiste numa gestão pró-ativa do seu portfolio de ativos imobiliários, vendendo - parcial ou totalmente - ativos maduros e não estratégicos e adquirindo outros com potencial para criação de valor.
Esta estratégia permite que a Empresa continue a inovar e a fazer crescer o seu negócio, reinvestindo em novos projetos e continuando a criar valor para os seus acionistas e parceiros.
É importante sublinhar que, regra geral, temos mantido a gestão dos ativos nos quais reduzimos a nossa participação, o que demonstra a confiança dos investidores nas nossas competências de gestão.
Paralelamente, a Sonae Sierra prossegue uma estratégia de valorização dos seus ativos, sendo que o investimento total nas renovações e/ou expansões realizadas no último ano e/ ou ainda em curso é de 46,5 milhões de euros, prevendo-se um claro aumento deste valor nos próximos 12 meses.
Esta estratégia tem tido, de facto, um claro impacto na valorização dos nossos ativos.
Por exemplo, o portfólio global da Sonae Sierra em Portugal teve um retorno direto de 18,3% ao longo de três anos consecutivos até dezembro de 2016, o que corresponde a um desempenho superior à média do mercado em cerca de 3%, com base no benchmark do setor do retalho imobiliário elaborado pela consultora MSCI.
REUTERS:Nos primeiros nove meses reforçaram a estratégia de reciclagem de capital com várias aquisições. O ritmo deverá continuar em 2018?
PEDRO CAUPERS: Sim, procuraremos consolidar esta estratégia porque, como referi anteriormente, permite-nos continuar a inovar e a fazer crescer o negócio. Em 2017, a Empresa realizou várias aquisições importantes no mercado, por exemplo:
* O fundo Iberia Coop, a parceria estratégica criada pela CBRE Global Investment Partners (CBRE GIP) e pela Sonae Sierra, no qual a Sonae Sierra detém uma participação de 10% e por cuja gestão é responsável, adquiriu 100% do Albufeira Retail Park e a loja do Hipermercado Continente, no AlgarveShopping.
* A Socimi ORES, o veículo de investimento imobiliário criado em parceria com o Bankinter, que a Sonae Sierra gere e no qual detém 3,75%, adquiriu 16 ativos. Destes, 9 estão situados em Espanha (Fórum Leioa, Fórum Galar, Mercadona Oviedo, Aldi Supermarket Cadiz, Armuco ( Carrefour (PA:CARR) Logroño, Eroski Calahorra, Eroski Tolosa e Eroski Guernica) e Decathon Berango) e 7 em Portugal (Portimão Retail Center, Media Markt Braga, um supermercado localizado na Alta de Lisboa e arrendado ao Pingo Doce, Modelo Continente Cacém, Continente Bom Dia Charneca, Continente Bom Dia Padrão da Légua e Continente Bom Dia Braga).
* Através de uma joint venture (85/15) com a AXA Investment Managers - Real Assets, a Sonae Sierra concretizou a compra do Área Sur Shopping Centre, em Jerez de la Frontera (Espanha), ficando também responsável pela sua gestão.
Já em 2018, a Sonae Sierra concretizou mais uma importante operação ao criar uma parceria com a Ocidental para a aquisição dos centros comerciais MaiaShopping e GuimarãeShopping ao Sierra Fund.
No âmbito desta aquisição, a Ocidental deterá uma participação maioritária sobre os ativos e a Sonae Sierra ficará com uma participação minoritária e será responsável pela gestão dos dois centros comerciais.
O sucesso destas transações reflete a qualidade dos ativos e a capacidade da Sonae Sierra para implementar ativamente a sua estratégia de reciclagem de capital para reinvestimento em novos projetos.
Além disso, estas transações comprovam ainda o interesse dos investidores pelos nossos ativos, confirmando que o mercado está dinâmico e atrativo.
REUTERS: O mercado continua com oportunidades interessantes?
PEDRO CAUPERS: Ainda existem oportunidades interessantes no mercado de retalho imobiliário, mas como os preços têm subido, começam a ser cada vez mais escassas.
Para se obter boas oportunidades é necessário subir na curva de risco e apostar em projetos que incluam também algum tipo de expansão ou renovação ou então entrar em mercados numa fase menos adiantada do respetivo ciclo de investimento.
REUTERS: Qual o perfil de activos que procuram?
PEDRO CAUPERS: A Sonae Sierra procura ativos dominantes e de relevo na sua área de influência, que apresentem também oportunidades de criação de valor. Isto é, projetos onde a Empresa possa desenvolver iniciativas de expansão, renovação, e melhorias no mix comercial, entre outras iniciativas. Procuramos permanentemente ser inovadores na gestão dos ativos, de forma a alcançarmos um retorno interessante para os acionistas e para os nossos parceiros de investimento.
REUTERS: Como olham para o mercado de dívida e que estratégia pretendem adoptar na gestão do seu perfil?
PEDRO CAUPERS: Analisamos constante e sistematicamente o mercado de dívida e a sua gestão é adaptada às necessidades específicas de cada ativo.
Utilizamos dívida hipotecária, isto é, com garantia real do ativo, e com prazos longos. Em geral somos bastante conservadores em termos de alavancagem e preferimos dívida com pouca amortização anual ou mesmo do tipo "bullet".
A Empresa valoriza o modelo de relationship banking. Estamos no negócio numa perspetiva de longo prazo e vemos os bancos claramente como parceiros fundamentais deste negócio.
REUTERS: Sentem os investidores receptivos e condições de financiamento acessíveis?
PEDRO CAUPERS: Sim, as condições de financiamento são agora bem mais favoráveis do que durante os anos de crise. O financiamento tem um custo bem menor, as maturidades são mais longas e existe uma maior disponibilidade dos Bancos para oferecer condições interessantes.
Ou seja, os mercados da dívida estão hoje numa situação normalizada e há oferta de dívida em todos os países onde atuamos, incluindo, por exemplo, na Roménia ou mesmo na Grécia, embora neste último país ainda com limitações em termos de escala.
REUTERS:Há intenção de fortalecer o peso do financiamento das obrigações vs empréstimos bancários?
PEDRO CAUPERS: Não. Nos ativos individuais continuamos a apostar em dívida hipotecária, desde logo porque regra geral temos sócios a nível de cada ativo e precisamos de dívida sem recurso aos acionistas.
Mas na holding Sonae Sierra temos alguma dívida corporativa estruturada através de operações bilaterais com bancos. Esta dívida é de montante limitado e para esses montantes achamos que não faz sentido fazer o esforço de ir aos mercados públicos de obrigações.
REUTERS: Que ponto de situação faz do investimento imobiliário indirecto via fundos (APG, Madison, CBRE, Credit Suisse, Schroders (LON:SDR), etc)?
PEDRO CAUPERS: O investimento imobiliário através de fundos continua a ser um canal de investimento muito interessante.
Atualmente, a Sonae Sierra gere quatro fundos de investimento imobiliário: Sierra Portugal Fund, Sierra Fund, Iberia Coop e a Socimi ORES, sendo que nos três primeiros temos investidores institucionais como parceiros e no último (um veículo cotado em Bolsa) temos uma parceria com o Bankinter e um número elevado de investidores individuais como acionistas.
O principal objetivo destes veículos é oferecer aos investidores bons dividendos e uma valorização do capital através de investimentos em centros comerciais e outros ativos de retalho de elevada qualidade.
A gestão de cada veículo segue um compromisso comum: a Sonae Sierra gere cada veículo, bem como os ativos individuais durante o período de investimento, estando alinhada com os seus parceiros na medida em que é também um dos investidores de referência.
REUTERS: Como está a correr e o que guia estas apostas e parcerias?
PEDRO CAUPERS: As nossas parcerias procuram conciliar as necessidades dos investidores com o elevado conhecimento dos mercados e a capacidade de gestão da Sonae Sierra.
Nesse sentido, temos aumentado as parcerias com investidores institucionais, o que é um reconhecimento claro do bom trabalho desenvolvido. De facto, fazemos uma avaliação muito positiva destas parcerias e o nosso negócio não seria o que é hoje sem os nossos parceiros.
Eles contribuem para o nosso crescimento e a nossa solidez financeira, aumentando a nossa capacidade para tirar partido de boas oportunidades que apareçam nos mercados onde estamos presentes.
Mas acreditamos ser fundamental poder demonstrar alinhamento com os outros investidores, pelo que, regra geral, detemos uma participação na estrutura de capital dos ativos ou veículos de investimento que gerimos, partilhando o risco.
REUTERS: Estão no mercado para montar novos produtos com outros fundos? Se sim, que perfil procuram?
PEDRO CAUPERS: Sim, é nossa intenção prosseguir a estratégia de lançamento de novos fundos e veículos de investimento. Mas a nossa estratégia de crescimento não se limita a criar e gerir esses novos fundos e veículos.
Procuramos também outros formatos, como são disso exemplo as parcerias que fizemos com a AXA para a aquisição do Area Sur em Espanha e com a Ocidental para a aquisição de dois centros em Portugal.
Os moldes em que iremos estruturar novos investimentos serão os que se revelarem mais adequados a cada situação. (Por Daniel Alvarenga; Editado por Sérgio Gonçalves)