O rally do ouro, que teve início em janeiro deste ano, encontra-se agora em uma prolongada pausa. O preço do metal amarelo experimentou queda de 1,9% em meados de março, comportando-se no início deste mês através de uma tendência lateral ao nível de 1220 USD por onça, uma significativa queda a parti dos altos níveis atingidos durante as primeiras semanas de março.
A principal razão para o declínio no preço do ouro baseia-se em uma série de comentários "hawkish" [a favor do arrocho da política monetária] de alguns membros do FOMC, os quais sugeriram a possibilidade de um aumento da taxa básica de juros nos Estados Unidos já na próxima reunião da comissão em abril. O presidente do Federal Reserve Bank da Filadélfia (FRB), Patrick Harker, bem como o presidente do Federal Reserve Bank de Chicago, Charles Evans, admitiram a possibilidade de Fed elevar as taxas de juros em três oportunidades ao longo deste ano de 2016 ao invés das duas vezes anteriormente anunciadas.
Estas declarações, na verdade, vieram a somar as informações anteriormente publicadas pelos presidentes do Federal Reserve Bank de Atlanta, São Francisco e Richmond, de modo que os traders se sentem agora coagidos em reavaliar seus prognósticos sobre a dinâmica das taxas, derrubando o preço do ouro. As estatísticas positivas acabaram por a mudar a retórica "dovish" [a favor do relaxamento da política monetária] de alguns membros do FOMC em favor do arrocho monetário. Essa mudança brusca no sentimento somente aumentou a incerteza sobre a ulterior intervenção do regulador norte-americano, o que eventualmente irá trabalhar a favor dos "touros" de ouro.
Taxas de juros do Fed e a inflação norte-americana
Certamente, os fatores fundamentais mais importantes que possuem real capacidade de afetar o valor do ouro são a inflação norte-americana e as taxas de juros estabelecidas pelo Federal Reserve dos EUA.
Observa-se nos últimos meses o acelerado ritmo do índice de preços ao consumidor (CPI), atingindo em fevereiro 2,3% ao ano, nível este atingido somente em 2008. O resultado desta dinâmica é a formação da tendência "bullish" no mercado de ouro diante da perspectiva de taxas de juro negativas nos Estados Unidos. Ao longo da história, desde 1970, o declínio nas taxas de juros reais abaixo de zero foi acompanhado por um rápido crescimento das cotações de ouro.
Tal fenômeno é explicado de maneira simples. O ouro é muito sensível às alternativas que oferecem potencial de renda, tais como obrigações ou ações com dividendos. Os reduzidos rendimentos proporcionados pelos títulos do Tesouro americano preparou um terreno fértil para os "touros" de ouro. O gráfico abaixo mostra a dinâmica do preço do ouro e a diferença entre os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA com base no índice de preços ao consumidor. A correlação negativa torna-se evidente.
Janet Yellen, presidente do Fed e grande defensora da "curva de Phillips", correlação macroeconômica que relaciona o nível de emprego e inflação, considera cuidadosamente que o Fed deve tomar a decisão de aumentar as taxas de juros levando em consideração a meta de 2% de inflação. Caso observe-se ainda o impacto negativo das taxas de juro este ano, o rendimento real dos títulos do Tesouro norte-americano cairá, o que irá reforçar os preços dos ativos de ouro.
Câmbio do dólar
No entanto, por agora, o valor dos rendimentos de títulos reais, embora em declínio, estão acima de zero, o que torna a atual tendência "bullish" para o ouro instável. O comportamento dos preços de ouro nos mercados é, em muitos aspectos, semelhante ao comportamento do dólar. As flutuações cambiais têm um impacto profundo sobre o valor do metal. Uma vez que o ouro é considerado juntamente com o dólar norte-americano e o euro um ativo de reserva, ele responde à dinâmica das sessões cambiais ao redor do mundo. A desvalorização do dólar contra as outras principais moedas de reserva, como observada no período entre 2002 e 2008, acaba por aumentar o preço do metal dourado. Por outro lado, o fortalecimento da moeda norte-americana tem um impacto negativo sobre o preço do ouro. Embora tenha havido dinâmica positiva do mercado de ouro, a recuperação da economia dos EUA (o seu crescimento em 2015 foi de 2,4%), bem como a política monetária divergente do Fed e de outros reguladores dos principais paíse, vão restringir a dinâmica positiva do mercado de ouro.
Incertezas e fuga para o ouro
As ameaças de guerra, crises financeira, ataques terrorista criam condições que inevitavelmente levam a um rápido aumento dos preços do ouro, uma vez que os investidores buscam proteção ao aplicar seus recursos em ativos tradicionalmente menos propensos ao risco, nos quais se inclui o ouro. De fato, o ouro tem subido acentuadamente após os EUA enviaram tropas para o Afeganistão em 2001, bem como quando o exército norte-americano entrou no Iraque. O preço do metal vem crescendo após os trágicos acontecimentos nos Estados Unidos e em Paris, bem como após a recente onda de ataques terroristas em Bruxelas, subindo 1,2%. Apesar do impacto de tais eventos ser limitado no tempo, não se pode subestimar sua influência nas condições de instabilidade geopolítica.