Intervenção Inicial do Governador Carlos da Silva Costa na Comissão de Trabalho e Segurança Social e na Comissão de Orçamento e Finanças e Modernização Administrativa
14 fev. 2018
Intervenção Inicial do Governador Carlos da Silva Costa
Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Bom dia,
Nesta breve intervenção inicial gostaria de deixar algumas notas de clarificação do papel do Banco de Portugal na questão que é objeto da minha vinda a esta Comissão, bem como sobre um conjunto de temas relacionados.
1. A possível entrada da SCML no capital da CEMG
A minha presença nesta Comissão foi solicitada a fim de “prestar todos os esclarecimentos sobre os contornos que envolvem a hipótese da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) entrar no capital da Caixa Económica Montepio Geral, S. A. (CEMG).”
Sobre esta temática afigura-se-me importante salientar que:
- O Banco de Portugal (i) não induziu a realização de qualquer negócio entre a SCML e o Montepio Geral – Associação Mutualista (MGAM), (ii) nem tem de se pronunciar sobre qualquer decisão de alienação de parte de capital da CEMG à SCML.
- A decisão de alienação de uma participação de capital por parte de um acionista é da sua responsabilidade e não do supervisor. Os termos da concretização podem, contudo, estar sujeitos ao escrutínio do supervisor e seu subsequente condicionamento.
- O Banco de Portugal valoriza a diversificação da estrutura acionista de qualquer instituição por si supervisionada enquanto mecanismo habilitador de resposta às exigências prudenciais. Neste contexto, o Banco de Portugal tem assumido, de uma forma geral, uma posição de princípio favorável à entrada de um novo acionista na CEMG.
- Neste momento, o Banco de Portugal não dispõe, nem teria de dispor, de informação concreta sobre os termos de uma eventual cedência à SCML de parte da participação que o MGAM tem na CEMG. Tratam-se de negociações entre duas entidades privadas (SCML e MGAM), não sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, cujas decisões financeiras (racional e oportunidade) são da sua exclusiva responsabilidade.
2. A prestação de informação pelo Banco de Portugal a esta Comissão
Sobre a prestação de informação pelo Banco de Portugal relativamente à CEMG, gostaria de recordar que esta se encontra condicionada pelos seguintes fatores:
- Em primeiro lugar, a CEMG é uma instituição bancária em plena atividade, pelo que o Banco de Portugal se encontra vinculado pelo dever de segredo profissional estabelecido no artigo 80.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.
- Em segundo lugar, a supervisão das instituições de crédito é da responsabilidade do Mecanismo Único de Supervisão, o qual delega essa responsabilidade nas autoridades de supervisão nacionais relativamente às instituições classificadas como Less Significant Institutions, mantendo o respetivo acompanhamento.
3. A transformação da CEMG em Sociedade Anónima
À luz das referidas limitações, releva destacar o seguinte.
Até finais de 2015, a CEMG exerceu a atividade como uma caixa económica que funcionava junto da respetiva associação mutualista – o MGAM –, partilhando com esta o seu órgão de administração.
Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 190/2015, de 10 de setembro, foi aprovado o mais recente Regime Jurídico das Caixas Económicas no sentido de contribuir para a robustez, autonomia e qualidade de governo das caixas económicas. Ao abrigo do referido regime, a CEMG é qualificada como caixa económica bancária (por oposição às caixas económicas anexas).
Em novembro de 2016, o Banco de Portugal determinou a transformação da CEMG em sociedade anónima, após consulta à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários. A CEMG alterou então os seus estatutos. O Banco de Portugal autorizou a transformação e a assembleia geral da CEMG deliberou sobre a questão em abril de 2017.
A CEMG é hoje uma entidade jurídica autónoma organizada sob a forma de sociedade anónima, claramente autonomizada do ponto de vista orgânico e de modelo de governo, em relação ao seu acionista. Enquanto caixa económica bancária, é equiparada a um banco e encontra-se sujeita ao Regime Geral das Instituições de Crédito e respetiva legislação conexa.
4. Reforço da identidade da CEMG e separação do MGAM
Tem sido trilhado um caminho de reforço da identidade da CEMG e de efetiva separação do acionista (o MGAM).
O processo de separação/diferenciação de marcas, parte de um conjunto alargado de ações que têm vindo a ser desenvolvidas ao nível do governo interno, é motivado pela necessidade de transparência sobre os emitentes e a natureza dos produtos colocados ao balcão das instituições.
A CEMG, à semelhança de outras instituições, está sujeita às regras vigentes por forma a fornecer toda a informação aos investidores sobre quem são os emitentes e as características dos produtos por si comercializados. Tais emitentes e produtos podem estar sujeitos a supervisão especificamente aplicável consoante a sua natureza.
No caso em concreto do MGAM, trata-se de uma entidade não sujeita à supervisão do Banco de Portugal, tutelada pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. Não compete ao Banco de Portugal fiscalizar a sua atuação, nem os produtos emitidos pelo MGAM se encontram sujeitos à supervisão do Banco de Portugal.
No entanto, em virtude de os produtos do MGAM também serem comercializados aos balcões da CEMG, e tendo em vista acautelar os riscos de uma perceção incorreta da natureza dos produtos emitidos pelo MGAM por parte dos clientes e do público em geral, designadamente a eventual confundibilidade desses produtos com depósitos bancários, o Banco de Portugal tem vindo a acompanhar a questão, numa perspetiva prudencial, para que cada investidor esteja devidamente esclarecido.
Neste contexto, o Banco de Portugal determinou à CEMG a apresentação de um plano de ação que assegurasse a separação entre ambas as marcas, de modo a tornar publicamente percetível, de forma clara e inequívoca, as diferenças entre as duas instituições.
Para dar cumprimento a esta determinação, a CEMG apresentou um plano de ação que se encontra em curso, com destaque para:
(i) A criação de espaços próprios mutualistas e com gestores próprios nos balcões da CEMG, focados em exclusivo na oferta de produtos do MGAM (designados por “Postos Mutualistas”);
(ii) A redenominação dos produtos da CEMG, reforçando a denominação “Caixa Económica”, e
(iii) A alteração das plataformas digitais utilizadas na interação com os clientes, sendo de realçar a reformulação do sítio de Internet da CEMG, que passou a dispor de uma página própria e segregada da página do MGAM.
Adicionalmente, o Banco de Portugal determinou à CEMG a elaboração de uma política de prevenção de conflito de interesses, que incluísse orientações específicas em matéria de relacionamento com partes relacionadas.
Cumpre esclarecer que o Banco de Portugal não determinou a criação de uma nova marca. Tal decisão depende exclusivamente da vontade da CEMG e do(s) seu(s) acionista(s), os quais poderão tomar essa opção se entenderem que a mesma é essencial para dar resposta às preocupações prudenciais manifestadas pelo Banco de Portugal.
Estou à disposição dos Senhores Deputados para responder às questões que considerem pertinentes.
Muito obrigado.