Por Sergio Goncalves e Axel Bugge
LISBOA, 24 Mai (Reuters) - Os socialistas que governam Portugal, após se terem aliado ao Partido Comunista Português (PCP) e ao Bloco de Esquerda, estão a capitalizar os galões de 'campeões das contas certas' e apostam no voto dos eleitores moderados para vencerem o próximo ciclo eleitoral, segundo analistas e políticos.
Segundo as sondagens, os socialistas portugueses podem ser os social-democratas mais votados no continente em termos percentuais - à medida que conquistam votos do centro-direita.
As pesquisas de opinião apontam para uma vitória destacada do Partido Socialista (PS) nas eleições europeias do próximo fim de semana e colocam o PS a uma distância curta da maioria absoluta nas eleições legislativas de Outubro.
Seria uma grande conquista para o primeiro-ministro António Costa, que rompeu com a tradição política em 2015 ao se associar aos partidos euro-cépticos à sua extrema esquerda, PCP e Bloco de Esquerda, para tomar o poder do centro-direita.
A secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, realçou que o PS, ao longo destes três anos e meio de governação, até "se reforçou na sua identidade, na sua matriz ideológica - absolutamente europeísta, absolutamente social-democrata, defensor radical da democracia".
"Estes pressupostos nunca estiveram em causa (...) a governação foi equilibrada, moderada, social-democrata e progressista", disse Ana Catarina Mendes.
Adiantou que "a grande vantagem da solução governativa foi demonstrar que o PS está forte, não saiu do seu espaço ideológico e teve como parceiros nesta governação os partidos à esquerda do PS, que também não perderam a sua identidade".
O cientista político António Costa Pinto, professor da Universidade de Lisboa, referiu que "o grande balanço feito em parte pela sociedade portuguesa é que, apesar dos acordos à esquerda, globalmente o Governo foi o 'Governo normal' do PS".
"Claro, houve recuperação salarial, de rendimentos, o aumento do salário mínimo, (...) mas António Costa não é Jeremy Corbyn do PS português", afirmou.
Explicou que "essa foi a quadratura do círculo que António Costa conseguiu: acordos parlamentares, mas não um Governo de coligação, e a conjuntura económica e parte da sua política social permitiu-lhe ter uma típica política social democrata, cumprindo com todo o rigor os compromissos com Bruxelas".
Analistas dizem que o PS está a capitalizar o facto do Governo visar excedentes orçamentais a partir de 2020, estimando um défice público de 0,2 pct do PIB em 2019 - o mais baixo em 45 anos de democracia, pelo terceiro ano consecutivo.
António Costa, que defendeu 'virar a página da austeridade' do Executivo de centro-direita, vê a economia a crescer 1,9% em 2019, acima da média europeia, mas abaixo dos 2,2% em 2018.
A vice-presidente do CDS-PP Cecília Meireles referiu que o seu partido "nunca criticou o facto de se estar numa situação orçamental próxima do equilíbrio, mas sim a forma como se chegou lá - com cortes de investimento e mais carga fiscal".
"Foi através de basicamente enganar as pessoas, dizendo que o Estado ia fazer umas determinadas despesas e depois, pura e simplesmente, o Governo fazer cativações cegas - cortou-se a eito no investimento público", adiantou.
LIDERA
Mas, na sondagem da RTP/Católica para as eleições europeias, feita entre 16 e 19 de Maio, após a mini-crise sobre o reconhecimento do tempo integral de serviço dos professores, o Partido Socialista (PS) pode vencer as europeias com 33%, ou seja uma diferença de 10% para o Partido Social Democrata (PSD).
A sondagem da TSF/Pitagórica para as eleições europeias, divulgada ontem, o PS tem 32,4% das intenções de voto, contra 30,3% em Abril e o PSD 24,8%, versus 28,7%.
Quanto às legislativas de Outubro, a sondagem da RTP/Católica põe o PS com 39%, um salto significativo face à votação de 32% que o PS teve nas eleições de 2015, e 11 pontos percentuais acima do PSD.
"Tenho a expectativa que o PS vai ter um bom resultado nas eleições europeias, ou seja vencê-las. Se o contributo do PS português pode ser algum, é ajudar que o PS Europeu se reforce", disse Catarina Mendes, lembrando que o Parlamento Europeu pode ficar espartilhado pelas extremas direita e esquerda.
António Costa Pinto disse que, olhando para a resiliência do sistema partidário face à entrada de novos partidos, é difícil o PS ter uma maioria abasoluta nas legislativas, ou 42% a 43% dos votos, frisando: "evidentemente pode acontecer, mas terá de haver condições excepcionais como uma grande crise no PSD".
"Teria de implicar transferências de voto significativas do Bloco de Esquerda, dos que já votaram PS; e também do PSD, sobretudo porque o eleitorado português tem fraca ancoragem ideológica partidária e tem uma fluidez relativamente grande".
"Mesmo que o PS tenha como objectivo a maioria absoluta, que é natural que seja o objectivo de qualquer partido de governação, não o vai dizer", disse afirmou Costa Pinto.
Contudo, há dirigentes socialistas que a defendem.
Numa recente entrevista à Visão, Fernando Medina, presidente da Câmara da Lisboa, disse que, na sua opinião, "seria melhor o PS ter uma maioria absoluta".
"O acentuar das divergências nesta campanha mostrará que os resultados de uma governação não são os mesmos, se a correlação de forças for uma ou for outra. E acho que esses resultados serão melhores se o PS sair reforçado das próximas eleições".
Fontes próximas do Governo têm dito que há um crescente incómodo com as duras críticas públicas do Bloco e do PCP à gestão financeira e que têm como alvo o ministro das Finanças, que quase equilibrou o Orçamento do país com 'contas certas'.
MINI-CRISE AJUDA
Segundo analistas, as sondagens sugerem que o PS beneficiou da mini-crise política em Maio, quando os partidos de direita se aliaram à extrema esquerda numa comissão parlamentar sobre um diploma para reconhecer o tempo integral de serviço professores.
Em reacção António Costa ameaçou demitir-se, já que estimava que a medida custaria mais 800 ME de despesa permanente anual, mas na votação final global a oposição recuou.
Jerónimo de Sousa, secretário geral PCP, então acusou o PS de "querer desfazer-se da actual correlação de forças", vincando: "já todos compreenderam que é o calculismo eleitoral e a fixação na maioria absoluta que levam o Governo do PS a ameaçar demitir-se".
Por seu turno, Cecília Meireles do CDS disse que "já toda a gente percebeu que esta crise não teve nada de real, foi artificial".
"O CDS apresentou uma Moção de Censura há alguns meses pois entende que o Governo devia demitir-se, mas o Governo andar a brincar com calendários eleitorais não parece uma maneira muito digna de terminar o mandato", acrescentou.
Contudo, Ana Catarina Mendes disse que "isso é querer 'tapar o sol com uma peneira' pois verdadeiramente aquilo que aconteceu foi uma teremenda irresponsabilidade por parte de todos esses partidos na Assembleia da República (AR)".
"Foi uma fraude perante os portugueses e os professores porque (PSD e CDS) sabiam que não tinham dinheiro para pagar essa medida", disse, realçando que "a direita deu uma cambalhota" enquanto o PCP e o Bloco sempre defenderam a medida.
"Olhando para as questões europeias e internacionais, o PCP, o BE e 'Os Verdes' votarão sempre contra o PS e isso nunca nos desviou de um caminho de credibilidade que levou Mário Centeno à Presidência do Eurogrupo", afirmou. (Escrito por Sérgio Gonçalves; Editado por Patrícia Vicente Rua e Catarina Demony)