Por Claudia Violante
SÃO PAULO, 30 Nov (Reuters) - Um mês depois do tombo de quase 8 por cento por causa da euforia com a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República, o dólar deve fechar novembro quase 3,5 por cento mais caro do que o real, mas o motivo não tem a ver com o cenário local.
Profissionais consultados pela Reuters atribuíram a valorização da moeda neste mês sobretudo ao mercado internacional, que ficou mais adverso para o risco em meio a temores com guerra comercial, desaceleração econômica, Brexit, Orçamento italiano e, claro, por que não, alguma expectativa sobre o novo governo do Brasil.
"O mercado ainda é muito construtivo com o novo governo", resumiu o diretor de Tesouraria do Bank of China, Jayro Rezende.
O exterior, assim, foi o principal driver do mercado de câmbio em novembro e pode continuar se manifestando em dezembro já que muitas das questões ainda não mostram solução.
"Quando se pega um cenário internacional complicado..., alta de juros nos Estados Unidos..., economias perdendo força e, aqui, há um vácuo de poder com o Congresso vendendo dificuldades, não há ímpeto para continuar o rali", explicou o presidente da BeeTech, empresa de soluções digitalizadas para transferências para fora do país e câmbio, Fernando Pavani.
Em setembro, a perspectiva de que a candidatura de Bolsonaro avançaria gerou um fortalecimento do real ante o dólar na reta final do mês, que terminou em baixa de 0,87 por cento. O resultado foi bastante amplificado em outubro, quando a confirmação de sua vitória fez o dólar terminar com o maior recuo mensal desde junho de 2016, num recuo de 7,79 por cento.
INFLUÊNCIA EXTERNA
Em novembro, entretanto, o dólar pouco a pouco foi ganhando força, com o exterior se sobrepondo às questões domésticas em grande parte do mês, mas o local também se destacou na última quinzena.
"Houve fluxo de saída no final de ano e o mercado também ficou um pouco receoso com a implementação das reformas, com o novo governo", disse o economista-sênior do Banco Haitong, Flávio Serrano, ao ponderar que os fundamentos não mudaram. "Então, em geral, eu imaginaria o dólar voltando para mais perto de 3,70 reais."
No final do ano, normalmente, cresce o fluxo de saída de recursos ao exterior, com emissão de lucros e dividendos de empresas a suas matrizes, o que pressiona as cotações da moeda.
O Banco Central, no entanto, agiu prontamente com a injeção de 3 bilhões de dólares em novos contratos de linha --venda com compromisso de recompra--para irrigar o mercado e ainda anunciou a rolagem de todo o vencimento de linha de dezembro, para tentar conter pressões que prejudicassem a cotação "normal" da moeda.
Também já avisou que pretende rolar integralmente os pouco mais de 10 bilhões de dólares em contratos de swap cambial tradicional --equivalente à venda futura de dólares-- que vencem em janeiro de 2019.
VOLATILIDADE
Em dezembro, quando a liquidez tende a cair ainda mais por causa das férias de final de ano, a volatilidade pode aumentar no mercado de câmbio, ainda mais se muitas das questões externas voltarem a azedar os ânimos dos investidores.
O Federal Reserve, banco central norte-americano, no entanto, aliviou um pouco a pressão altista da moeda ao sinalizar esta semana que a trajetória de aumento dos juros nos EUA pode ser mais suave do que imaginado, e há expectativa de que os presidentes dos EUA, Donald Trump, e da China, Xi Jinping, cheguem a um acordo na cúpula do G20, em Buenos Aires.
"O que manda nesse momento é fluxo... se aprovar a cessão onerosa, vai abrir o mercado para a concorrência de empresas estrangeiras e o dinheiro pode voltar", pontuou Rezende, do Bank of China. "Uma outra pernada de melhora seria com as expectativas se materializando", acrescentou.
Nesse ponto, além da cessão onerosa, que pode trazer uma receita bilionária para ajudar no ajuste fiscal e ainda ser aprovada durante a transição, há a reforma da Previdência, uma das principais preocupações do mercado.
Após um novembro sob influência direta de desdobramentos externos, as dúvidas sobre o início do governo Bolsonaro tendem a continuar no radar de investidores e ter mais peso nos próximos meses.
"Os cem primeiros dias de governo... definem, vemos a vontade do governo de peitar as coisas ou não", comentou o especialista em câmbio Roberto Awerianow, da Frente Corretora.
"Parece que o mercado se esqueceu como é um período de transição. Há muita ansiedade."
(Edição de Maria Pia Palermo e Iuri Dantas)