4 Mar (Reuters) - Ai Weiwei, o dissidente chinês cuja arte activista fez dele o crítico mais conhecido de Pequim, trocou o exílio britânico por Portugal, onde, numa propriedade rural a leste de Lisboa, está a trabalhar num monumento em memória de Mikhail Gorbachev.
A mudança da Ai para Berlim em 2015, em parte por gratidão ao lobby alemão pela restauração do seu passaporte, foi considerado um sinal da ascendência cultural e política da cidade, tal como muitos viram a sua mudança para a Grã-Bretanha em 2019 como um voto de confiança no futuro pós-Brexit daquele país.
Contudo Ai disse que, apesar de manter uma residência em Cambridge, onde o seu filho vai à escola, e um estúdio em Berlim, ele é feliz em Portugal na sua quinta com piscina envolta por um relvado verde e exuberante, e onde tem duas gaiolas de pássaros exóticos.
"Adoro Portugal", disse Ai, 63 anos, sentado no seu jardim sob o sol de Inverno. "Ficarei aqui por muito tempo, a menos que algo aconteça".
Ai, que ajudou a desenhar o famoso estádio de Bird's Nest dos Jogos Olímpicos de Pequim 2008, antes de falar de um regime que o aprisionou brevemente, lamentou a falta de uma figura como Gorbachev na China.
Criticou também o novo pacto de investimento da União Europeia com a China, dizendo à Reuters que a Europa estava a acumular problemas para si própria ao relacionar-se com uma China "muito estratégica".
Elogiou Gorbachev, que fez 90 anos esta semana, por permitir que a União Soviética autoritária se desenrolasse pacificamente, avisando que a China enfrentava um futuro difícil se não seguisse o mesmo caminho.
Gorbachev é uma figura controversa, aclamado em países que já não são controlados por Moscovo, como um visionário que se absteve de lidar com manifestantes pró-democracia com violência, mas muitos em Moscovo e Pequim vêem-no como um perigoso "bungler" que permitiu o colapso de uma grande potência.
"Até hoje, não vemos ninguém como Gorbachev na China", disse ele. "Mas se a China não tiver uma reforma política como a que Gorbachev iniciou, não haverá um bom resultado do desenvolvimento económico da China".
Tem vindo a trabalhar com a Fundação Cinema pela Paz do activista esloveno Jaka Bizilj, que trouxe o dissidente russo Alexei Navalny a Berlim para se curar depois de ter sido envenenado na Rússia no ano passado, Ai planeia construir um monumento de Gorbachev para o centro de Berlim, a antiga cidade dividida que se encontrava na linha da frente da Guerra Fria.
"Gorbachev é um dos mais importantes teóricos, visionários, que ajudou a estabelecer uma nova possibilidade para a sociedade", disse ele. "E Berlim é uma cidade muito política. Gorbachev é sempre simbólica para as pessoas que procuram a liberdade".
Texto na íntegra em inglês: (Reportagem de Catarina Demoney em Montemor-o-Novo e Thomas Escritt em Berlim; Editado por Raissa Kasolowsky; Traduzido por Mariana Ferreira Azevedo< Editado em portugues por Sergio Goncalves em Lisboa )