Do conhecimento que tenho, a instituição que têm mais economistas ao redor do mundo é a Reserva Federal Americana, com mais de 4000 economistas altamente qualificados. Na universidade eles aprenderam estes modelos e quem ingressa na universidade também aprende a curva de Phillips e os multiplicadores Keynesianos (pelo menos eu abordei esta matéria), creio que será senso comum em todas as universidades portuguesas e, em geral, ao redor do mundo. Mas será que andamos a aprender coisas que não funcionam?
“Estagflação”, diria ser uma palavra que os economistas não acreditam que se concretize (hoje). A visão que predomina é que uma recessão é caracterizada por um desemprego mais elevado e uma redução da despesa, e a inflação é desencadeada pelo pleno emprego e pelo aumento da despesa, daí que não podem acontecer em simultâneo. Na minha ótica, esta visão não está correta, e estagnação económica e inflação podem suceder as duas em simultâneo, e a isso se dá o nome de “Estagflação”.
O primeiro argumento da “Estagflação” é a estagnação do crescimento. Isto pode assumir a forma do que os economistas chamam “recessão técnica” (dois trimestres consecutivos de declínio do Produto Interno Bruto “PIB”) ou simplesmente aquilo que os espanhóis chamam “Ralentización Económica” (acho muito engraçado o termo em espanhol daí empregar aqui o mesmo), o mesmo é dizer um crescimento lento a uma taxa inferior ao crescimento potencial de uma dada economia. A maior economia do mundo (USA) cresceu nos últimos anos, mas o crescimento permaneceu abaixo da média histórica!
O crescimento deve-se a política monetária? Não, deve-se, sim, a uma política fiscal sem precedentes, incorrendo em défices anuais enormes, falamos de triliões de dólares (biliões europeus). A política fiscal que envolve despesas diretas com défice governamental produz um crescimento que a política monetária não consegue alcançar! Mas qual o custo desta mesma política?
A economia Keynesiana (forma geral) diz-nos que os gastos do governo em tempos de recessão ou quando as poupanças dos consumidores são demasiado elevadas podem estimular o crescimento. Isto é, se a “National Debt” for moderada, é possível obter mais de 1 dólar de crescimento por cada 1 dólar de despesa governamental financiado por empréstimos. Ao hoje, essas condições já não fazem sentido/não se aplicam!
Multiplicador Keynesiano está fraturado!
O rácio “National Debt/GDP” é de, 134%, o mais elevado da história dos USA! Os gastos do governo são frequentemente direcionados para projetos não produtivos. Quando a dívida aumenta mais rapidamente do que o PIB, o que acontece atualmente, o rácio “National Debt/GDP” aumenta e o multiplicador Keynesiano diminui. Isto é, está a tentar contrair empréstimos e gastar para sair de uma crise de dívida, que o caminho que deverá levar será o incumprimento (o que não é necessário ou desnecessário, visto que, os USA podem imprimir dólares) ou numa hiperinflação (a probabilidade está lá), e não é descabido ter esta possibilidade em cima da mesa.
Tanto o incumprimento ou uma hiperinflação por norma acontecem no final de uma hegemonia, ou de um jogo de poder, e pode levar muitos anos, o que vai a acontecer nos bastidores ao longo de tempo é outra história. Para Biden e a curto prazo pode ser um impulso importante, visto estarmos num ano eleitoral, mas é um obstáculo ao longo do tempo (longo prazo) ao crescimento dos USA. Um parênteses: o que falei anteriormente faz-me lembrar quando vamos a um bar para beber umas cervejas, para esquecer os problemas que tivemos seja uma quebra na relação ou no trabalho, ou qualquer outra coisa, bebemos para esquecer, e naquele momento os problemas varrem-se da nossa mente acredito eu, pois, eu não bebo, mas no dia seguinte além da ressaca, o problema vai continuar lá.
USA igual ao Japão? Já esteve mais longe, o “National Debt/GDP” do Japão anda a rondar os 260%! O Japão tem estado numa longa depressão desde 1990, pontuada por nove recessões técnicas distintas. O Japão não pode “estimular” o seu caminho para o crescimento. Só podem continuar a gastar com défice para sustentar o crescimento nominal, ao mesmo tempo que agravam o seu rácio da dívida e os problemas de crescimento lento.
Os USA e um pouco pelo mundo estão a seguir o mesmo caminho, daí que a estagnação económica na forma de crescimento fraco e recessões ocasionais é o futuro da economia dos USA, apesar dos trimestres recentes que têm mostrado dados fortes. Em suma, a estagflação deve estar bem presente na cabeça dos mais de 4000 economistas da Reserva Federal!
Relativamente ao capítulo inflacionário e a hipótese da estagnação económica, tudo é aberto ao debate e não estou a assumir que sou o dono da razão, pois, é só mais uma opinião no meio de milhões de opiniões, mas existem factos tais como, a inflação vêm subindo há 3 meses consecutivos, se formos um pouco mais atrás a inflação têm estado num intervalo persistente em torno dos 3,3% durante os últimos 10 meses! Estará a inflação da volta? Ou, na verdade, ela nunca se despediu de nós?
Há diversas formas de medir a inflação, o “IPC” é uma delas e têm em conta o petróleo que são um fator muito importante, pois, a título exemplificativo, até as pastilhas elásticas levam petróleo ou algo derivado do mesmo na sua composição. O preço de petróleo, desde dezembro de 2023, têm subido até ao pico que registou nos $88 em abril, continuará a tendência de subida?
Acontecimentos que impulsionam a inflação do lado da oferta como o colapso da Key Bridge em Baltimore, o encerrar da rota marítima Mar Vermelho/Canal de Suez e as consequências das sanções da guerra contra a Ucrânia. Estas restrições do lado da oferta podem ser deflacionárias no longo prazo, mas inflacionárias no curto prazo!
Modelos utilizados pela Fed (Reserva Federal Americana)
Vê-se pelo gráfico dos “Dot Plot” que é um gráfico de pontos, utilizado pelos vários bancos centrais dos USA, em que cada um expressa a sua opinião de qual deve ser o ponto médio da taxa de juro diretora para um determinado período temporal. Em alguns momentos (muitos) existe uma dispersão brutal, e isso mostra que não existe nenhum modelo de previsão. Não é ao acaso (tipo lotaria), mas às vezes parece!
Curva Phillips, outra coisa estudada na universidade na cadeira de macroeconomia, e o que este modelo nos diz é: existe uma correlação inversa entre desemprego e inflação. Se o desemprego for baixo, deve-se esperar que a inflação seja elevada e vice-versa. A justificação assenta que o mercado de trabalho restritivo leva a exigências salariais que aumentam os gastos e alimentam a inflação.
- No início da década de 1960, os USA tinham desemprego e inflação baixos.
- No final da década de 1970, os USA tinham um elevado desemprego e uma inflação elevada.
- Em 1980 a inflação era elevada e o desemprego também.
- Na década de 1930, os USA tinham um elevado desemprego e encontravam-se em deflação.
- A apoiar o modelo da curva de Phillips temos, por exemplo, 1973–1975, em que o desemprego era baixo e a inflação elevada.
Em suma, a curva de Phillips tende a errar com alguma frequência. Existem diversas causas tanto para o desemprego como para a inflação, mas a relação inversa entre elas não é propriamente uma verdade.
FED (Quantitative Tightening e Quantitative Easing)
Para a FED corte na taxa de juro diretora = igual a estímulo monetário, aumento da taxa de juro = aperto monetário. Será verdade?
Quando as economias estão em expansão, as taxas de juro sobem porque as empresas competem por mais fundos para expandir a capacidade e fazer investimentos, pois, se não se coloca um travão, as coisas podem ir longe demais. Taxas elevadas vão acabar por levar ao excesso de capacidade e à recessão. Taxas baixas vão acabar por levar a oportunidades de investimento e a uma nova expansão.
Mas pontos de viragem (por norma) tendem a acontecer nos extremos, como parte de um ciclo económico normal. Numa situação “standard” taxas mais elevadas estão associadas a tempos bons e taxas baixas estão associadas a recessões/depressões.
A FED não lidera o ciclo económico, mas persegue-o! Eu costumo utilizar a expressão do gato e do biscoito que consiste no seguinte: se eu tiver o biscoito o gato vêm até mim, mas se eu correr atrás do gato para lhe dar o biscoito tenho que andar atrás dele.
Em resumo, a FED continua a insistir numa política monetária restritiva para combater a inflação. Mas a inflação não é causada por eles, é causada sim por perturbações no lado da oferta (problemas no petróleo e outras questões relacionadas com a cadeia de abastecimento global) e uma série de outros fatores que a FED não controla. A Fed está a trabalhar bem para colocar a economia americana brevemente numa recessão. No entanto, com a inflação a aumentar devido a problemas na cadeia de abastecimento, bolhas de ativos e aumentos dos salários, será esta a receita para a estagflação?