Na passada quarta-feira, a administração Biden manifestou o seu apoio à ideia de suspensão das patentes para as vacinas contra a Covid-19 de modo a acelerar a sua produção e distribuição a nível mundial.
Apesar da importância dos direitos de propriedade intelectual, Washington “apoia a isenção destas proteções para as vacinas para a covid-19”, disse a representante comercial dos Estados Unidos, Katherine Tai em comunicado.
Os pobres
Quando a Índia e a África do Sul abordaram a Organização Mundial do Comércio pela primeira vez em outubro do ano passado com uma proposta para suspender os direitos de propriedade intelectual para todos os medicamentos e tecnologias relacionados à Covid-19, a ideia foi prontamente rejeitada. Os EUA e a UE não só se opuseram à renúncia do acordo de propriedade intelectual para os medicamentos da Covid, como também bloquearam qualquer discussão sobre ele.
Em causa estava uma proposta para os países usarem as suas fábricas para a produção local de vacinas. Esta opção permitiria, por um lado, aumentar a capacidade mundial de produção de vacinas e reduziria, por outro, as assimetrias no acesso à vacinação. Estes dois países são conhecidos, pela capacidade de produção de medicamentos, sendo a Índia o maior fabricante mundial de vacinas.
O humanista
Antes de se tornar presidente, Joe Biden já se tinha comprometido em mudar a abordagem do governo dos EUA para a indústria farmacêutica, apoiando um movimento para encerrar os direitos das empresas de fazer cumprir sua propriedade intelectual sobre as vacinas da Covid.
“Esta é a única coisa humana a fazer no mundo”, disse ele durante um evento de campanha em julho de 2020.
Todavia, até o momento em que a decisão foi anunciada, muitos no governo e na indústria duvidavam que o presidente dos EUA cumprisse sua promessa de campanha. Não só membros importantes da sua administração tiveram dúvidas, mas poucos executivos farmacêuticos acreditaram que um governo dos EUA realmente tomaria uma posição tão veemente contra o poderoso lobby da indústria.
O que nos disse o mercado
O impacto na bolsa deste anúncio foi imediato com as ações de Astrazeneca (LON:AZN) (-0,32%), Pfizer (NYSE:PFE) (-1,95%), Moderna (NASDAQ:MRNA) (-1,44%) e Biontech (NASDAQ:BNTX) (-1,62%), todas envolvidas na produção de vacinas contra a Covid-19, a sofrerem perdas no dia seguinte. A Johnson & Johnson (NYSE:JNJ) (0,40%) e Novavax (NASDAQ:NVAX) (0,45%) escaparam às perdas no dia seguinte.
A partir de sexta-feira, dia 7, a Astrazeneca, Pfizer e Johnson & Johnson mantiveram-se relativamente estáveis enquanto que, a Moderna continuou em queda moderada. Casos mais extremos foram o da Novavax que apresentou quedas avultadas e, o da Biontech que obteve elevado crescimento.
A maioria das ações do sector recuperaram nos dias seguintes, no entanto, ficamos todos a pensar nos efeitos que a suspensão efetiva das patentes poderá ter no mercado bolsista.
Erguem-se as barreiras
As reações também não se fizeram esperar, as farmacêuticas disseram na quinta-feira que o apoio do presidente Joe Biden à renúncia de patentes de vacinas Covid-19 poderia perturbar uma frágil cadeia de abastecimento e que, em alternativa, os países ricos deveriam partilhar mais generosamente as suas vacinas com o mundo em desenvolvimento.
Se for adotada pela Organização Mundial do Comércio, a proposta convida novos fabricantes que carecem de know-how essencial e da supervisão dos inventores, disse a Federação Internacional de Fabricantes e Associações Farmacêuticas.
O CEO da Pfizer, Albert Bourla, alertou na sexta-feira que renunciar às proteções de patentes para vacinas da Covid-19 desencadearia uma corrida mundial por matérias-primas que ameaça a fabricação segura e eficiente das vacinas. Mas Bourla, cuja empresa produz uma das três vacinas aprovadas para uso de emergência nos EUA, disse acreditar categoricamente que a proposta de isenção servirá para criar mais problemas.
O efeito Robin Hood
Embora não se trate de roubar vacinas aos ricos para dar aos pobres, a isenção das patentes permitiria eliminar assimetrias ao nível do acesso às vacinas. A maioria de nós concordará que não é justo ter acesso mais rápido ou mais demorado à solução para a uma pandemia global em função do país onde ser vive.
Uma vez que estas medidas tem um forte efeito nos bolsos das farmacêuticas, não é de estranhar que estas levantem obstáculos à sua execução. Alguns serão reais e fundamentados enquanto que outros, nem por isso.
O importante, nesta fase será iniciar o diálogo tendo em conta todas as vertentes presentes na equação: política, técnica e económica.