Por Daniel Alvarenga
LISBOA, 28 Set (Reuters) - O desafiante contexto do recém-criado banco postal está a retirar o foco dos CTT CTT.LS dos negócios 'core' de correio tradicional e expresso, ameaçados por crescentes pressões competitivas e pelo abrandamento económico, segundo Nuno Marques, gestor de fundos do Grupo CIMD.
As acções dos CTT-Correios de Portugal caíram mais de 30 pct em 2016, negociando próximo de mínimos de quase três anos, nos 5,97 euros, que compara com os 5,9 euros a que se estrearam em Bolsa em 5 de Dezembro de 2013.
"O projecto de um banco é sempre desafiante, em particular fazer um banco 'low cost' neste ambiente de taxas de juro tão baixas", disse Nuno Marques, gestor do fundo IMGA Acções Portugal, do Grupo CIMD, em declarações à Reuters.
"Só a questão de formação de trabalhadores é exigente e algo que consome recursos financeiros. Tudo isto desfoca os CTT da actividade 'core'", referiu o gestor de fundos do Grupo CIMD.
"Houve um esforço inicial para limpar gorduras de empresa pública (CTT), mas os ganhos de margem iniciais não se vão ver muito mais daqui para a frente, pelo menos depois da Gestão estar mais focada no BancoCTT".
O BancoCTT, cujo 'breakeven' é estimado para o terceiro ano de operação, apresentou um prejuízo de 9,5 milhões de euros (ME) no primeiro semestre de 2016, terminando o mês de Junho com 56 ME captados em depósitos e 20.200 contas abertas. No período, o investimento em activos fixos tangíveis e intangíveis do banco, capex, fixou-se em 7,8 ME.
O lucro do operador postal como um todo caiu 24 pct para 34 ME, penalizado pelos custos de lançamento do banco, menores receitas com a intermediação de dívida pública, menos tráfego postal e a perda de clientes em Espanha. ENDURECE
"O negócio de 'expresso e encomendas' é um pouco ameaçado pelo abrandamento da actividade económica em Portugal, mas também fruto da maior concorrência", referiu Nuno Marques.
"Domesticamente, o quadro geral para Portugal está difícil com a economia a abrandar. Associando isso ao facto da dinâmica operacional dos CTT ser fraca, tudo isto tem desapontado um pouco os investidores não domésticos dos CTT que pensam: com Portugal tenho risco político que não é controlável".
Em Agosto, a Autoridade da Concorrência acusou os CTT de abuso de posição dominante, impedindo a entrada ou a expansão de concorrentes no mercado nacional de serviços de correio tradicional.
"Pelos vistos, poderão também sentir maior pressão competitiva na actividade 'core' de correio tradicional, à luz da investigação dos reguladores que poderá forçar o operador a facilitar a abertura da sua rede", vincou o gestor de fundos do Grupo CIMD.
Lembrou que a actividade 'core' dos CTT tem declinado estruturalmente há algum tempo, via substituição do correio tradicional por correio electrónico.
"Os serviços financeiros serão sempre canibalizados pelos instrumentos do Estado, mais atractivos, que agora também são colocados via bancos e não apenas pelos CTT, com as Obrigações do Tesouro de Rendimento Variável", sublinhou Nuno Marques.
Na primeira metade de 2016, a operação em Espanha, onde os CTT detêm a Tourline, teve uma contribuição particularmente negativa para a rentabilidade.
Os rendimentos da área de Expresso e Encomendas recuaram 3 ME em Espanha em termos homólogos, comparado com 0,8 ME em Portugal e 0,2 ME em Moçambique.
"A questão de 'o que fazer com Espanha' já deveria ter sido clarificada. Se calhar era preciso uma decisão mais radical: ou ganhar escala ou sair", concluiu Nuno Marques, do Grupo CIMD. (Editado por Sérgio Gonçalves)