Por Sergio Goncalves
LISBOA, 8 Mar (Reuters) - Um grupo de 'bondholders' internacionais, prejudicados pelo Banco de Portugal (BP) ter retransferido 'bonds' do Novo Banco para o 'bad bank' BES em 2015, aumentaram a pressão sobre o BP e pediram ao Parlamento que 'chame' o governador para uma audição, segundo uma carta enviada ao Parlamento a que a Reuters teve acesso.
Nesta missiva, o Novo Note Group - coordenado pela Attestor Capital, BlackRock, CQS, PIMCO - adiantou que a decisão do BP "violou frontalmente disposições legais e princípios jurídicos fundamentais do Direito português e da União Europeia, por ser discriminatória e arbitrária".
Em causa está a decisão do BP, em 29 de dezembro de 2015, de transferir 5 séries de um total de 52 séries de Obrigações Sénior do Novo Banco - todas em igualdade na hierarquia de créditos, pari passu - de volta ao 'banco mau' que ficou com os activos tóxicos do BES, alvo de resolução em Agosto de 2014.
O Novo Note Group afirmou que detém, no total, mais de 1.000 ME daquelas Obrigações Sénior retansmitidas para o BES.
Aquela transferência foi a forma do BP, como autoridade de resolução, de recapitalizar o Novo Banco - o 'good bank' que emergiu dos escombros do BES e que foi dotado em Agosto de 2014 de 4.900 ME, que se mostraram insuficientes.
O grupo de 'bondholders' alertou os deputados para o facto da retransferência, "que expressamente discriminou investidores qualificados, ter sido particularmente lesiva e causadora de efeitos adversos para Portugal - os quais, de resto, persistem".
"Cremos que a audição parlamentar de Sua Excelência o Governador do BP é por isso essencial para tornar evidente a verdadeira extensão dos danos causados pela decisão de retransferência", refere a carta enviada ao Parlamento a 6 de Março.
Sublinha que "o impacto financeiro e económico, suportado em grande parte pelo Tesouro público e pelos contribuintes portugueses, deve ser tido em conta pelos responsáveis e esclarecido aos cidadãos portugueses".
"O BP deve igualmente detalhar quais os passos específicos que está disposto ou planeia tomar no futuro próximo para compensar esses danos", adianta o Novo Note Group.
Fonte oficial do BP disse que o banco central não comenta. Aquando daquela decisão o BP frisou que "foi explicitamente previsto que o BP poderia, enquanto autoridade de resolução e no uso desses poderes, alterar o perímetro de activos e passivos do BES e do Novo Banco".
Laurentino Dias, deputado e chefe de gabinete do grupo parlamentar do Partido Socialista referiu que "a carta chegou hoje e vai seguir os trâmites normais".
TRIBUNAIS
O Novo Note Group intentou "uma acção judicial de impugnação visando o reconhecimento de que a decisão de retransferência é ilegal e inválida, não tendo, por isso, produzido quaisquer efeitos".
O processo está pendente no Tribunal Administrativo de Lisboa e as partes aguardam o agendamento da data de julgamento, disse.
Adiantou que, além do Novo Note Group, cerca de 40 outras acções judiciais com objecto semelhante foram intentadas por outros detentores das Obrigações Sénior.
Afirmou que, tanto quanto é do seu conhecimento, um processo foi intentado por um grupo de 106 investidores individuais - não qualificados - que detêm Obrigações Sénior.
O Novo Note group boicotou emissões recentes de dívida da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e do Millennium bcp BCP.LS , mas estes bancos concluiram-nas.
CONTRIBUINTES PAGAM
"Embora a economia e as contas públicas portuguesas tenham apresentado melhoria recente, a verdade é que a decisão de retransferência contribuiu directamente para a verificação de custos acrescidos, e seguramente evitáveis, para os contribuintes portugueses", referiu.
Lembrou que, "num ambiente de aumento crescente das taxas de juro e considerando o fim dos programas de compra de dívida do BCE, será absolutamente crítica a capacidade de Portugal atrair uma base de investidores tão ampla quanto possível".
Afirmou que "os investidores institucionais, em particular aqueles que assumem um horizonte de longo prazo, como aqueles que compõem o Novo Note Group, desempenham um papel estabilizador durante situações de turbulência nos mercados".
"Na sua ausência, serão os investidores com visão de curto prazo a determinar os custos de empréstimos ao Estado português", avisou.
Recordou que, adicionalmente, os novos requisitos regulatórios de capital vão obrigar os bancos portugueses a atrair um volume significativo de capital nos próximos anos.
Mas, estes serão confrontados com "elevados custos da dívida" e "dificuldade em obter financiamento a preços competitivos nos mercados financeiros, em resultado da falta de confiança dos investidores".
O Novo Note Group referiu que, "em conjunto com outros investidores institucionais internacionais, está disponível para continuar a trabalhar com as autoridades portuguesas para restaurar a confiança no mercado português, a qual foi tão profundamente prejudicada pelas acções do BP".
"Isso permitiria ao Novo Note Group e outros investir em Portugal novamente. Consideramos que essa confiança só será restabelecida através da transparência e do diálogo com as autoridades portuguesas e que o BP se tem mostrado indisponível em oferecer", concluiu. (Por Sérgio Gonçalves; Editado por Daniel Alvarenga)