Por Sergio Goncalves
LISBOA, 19 Abr (Reuters) - A proposta governamental para a reforma da supervisão financeira em Portugal pode criar problemas e potenciar um efectivo enfraquecimento das regras de concorrência no sector financeiro português, disse a Autoridade da Concorrência (AdC), avisando que é difícil compatibilizá-la com o direito da União Europeia.
Esta proposta de 'Reforma do Modelo de Supervisão Financeira', que está em consulta pública, prevê atribuir poderes ao Conselho de Supervisão e Estabilidade Financeira (CSEF) em matéria de investigação de práticas anticoncorrenciais no sector financeiro.
A AdC adiantou que "a dispersão de poderes em matéria de política de concorrência introduz perturbações no actual quadro institucional, que se caracteriza pela sua solidez e é gerador de credibilidade e atratividade do investimento da economia nacional".
"A proposta de atribuição ao CSEF deste poderes (...) é susceptível de gerar de significativos problemas de conflito de interesse com as matérias de índole prudencial, potenciando um enfraquecimento da efectividade das regras de concorrência no sector financeiro em Portugal", avisou a AdC.
Explicou que, "com efeito, os sérios conflitos de interesse que a proposta encerra estão devidamente acautelados no atual desenho institucional, pelo que a passagem para a nova entidade de supervisão do sistema financeiro de poderes em sede de defesa da concorrência constituiria um retrocesso".
"A proposta criaria, assim, um significativo risco de enfraquecimento da concorrência nos mercados em causa, em vez de contribuir para a intensificar, maximizando o bem-estar social".
MENOS FINANCIAMENTO?
A AdC realçou que "o financiamento do CSEF não pode implicar uma diminuição das receitas próprias da AdC, nem uma alteração do actual modelo de financiamento da AdC, que assegura uma adequada proporcionalidade entre todas as Entidades Reguladoras".
"A efectivar-se, a redução do financiamento da AdC seria contrária às garantias de independência e efectividade da aplicação do direito da concorrência decorrentes do direito nacional e da União Europeia", afirmou a reguladora.
Lembrou que a fragmentação dos poderes de defesa da concorrência dificulta a coordenação operacional.
"(Tal) tende a prejudicar a coerência na promoção e aplicação da lei da concorrência necessárias à certeza jurídica das empresas, de forma a atrair investimento e promover a competitividade da economia nacional", referiu.
DESCREDIBILIZA
"A criação da AdC em 2003 teve como um dos seus principais objetivos precisamente colocar termo à anterior situação de dispersão dos poderes de aplicação e promoção da concorrência entre entidades diferentes, com evidente prejuízo para o desenvolvimento de uma política de concorrência credível e robusta em Portugal", disse.
A reguladora recorda que, "durante quase 15 anos, a AdC tem um historial de mais de 200 casos investigados nos vários setores da economia, representando o sector financeiro cerca de 6 pct dessas investigações.
"A punição de práticas anticoncorrenciais com sanções pecuniárias decorre, ademais, do direito da União Europeia, pelo que se afigura que esta solução seria contrária aos princípios da efetividade na aplicação do direito da concorrência da União a que Portugal está obrigado", concluiu.
(Por Sérgio Gonçalves; Editado por Patrícia Vicente Rua)