Está na hora de mudar a fiscalidade europeia?

Publicado 26.02.2020, 16:30
© Reuters.

Será a altura certa para mudar as regras europeias em matéria de impostos e despesa? Muitos peritos, ministros das finanças e responsáveis europeus defendem uma nova fiscalidade europeia adaptada à era atual de crescimento lento.

De acordo com o Eurostat, em 2018, apenas dois países da União Europeia ultrapassaram o limite de 3% de défice orçamental (a Roménia e Chipre). No entanto, vários países registam um nível de endividamento considerado elevado por Bruxelas. Por exemplo, as dívidas da França, da Bélgica, da Itália, de Espanha, da Grécia e Portugal andam perto ou são superiores a 100% do PIB.

Austeridade excessiva ameaça crescimento?A Comissão Europeia pode sancionar os países que não respeitam o limite do défice orçamental e da dívida, mas não pode forçar um país a investir. Alguns países como a Alemanha, a Holanda e a Finlândia têm sido pressionados a aumentar a despesa, porque possuem margem orçamental suficiente para aumentar ou reduzir os impostos, sem por em causa a estabilidade das finanças públicas. Após uma década centrada na redução da despesa pública, a questão que se coloca hoje é saber se a austeridade excessiva é uma ameaça ao crescimento.

Alemanha pressionada a gastar maisEm 2019, a Alemanha registou um excedente orçamental de 1,2%, o que representa 13,5 mil milhões de euros de receitas fiscais não utilizadas. Esse excedente, que deverá perdurar pelo menos até 2021, foi possível graças a um política fiscal severa, que alguns classificam como excessivamente austera. Recentemente, o FMI e a Comissão Europeia apelaram à Alemanha para investir o excedente orçamental na economia real.

"Não há qualquer razão que impeça que um investimento público de 1 ou 2% do PIB por ano, seja financiado pelo endividamento. Esse investimento ajudaria outros países europeus porque alguns dos bens que a Alemanha compraria seriam importados", disse à euronews Andrew Watt, economista do Hans-Böckler-Stiftung.

Berlim prevê investimento na rede ferroviáriaA rede ferroviária alemã é um exemplo de um setor que precisa de investimento. Um estudo recente indica que a Alemanha sofre de um atraso significativo ao nível da reparação das infraestruturas ferroviárias e que é necessário investir 50 mil milhões de euros no setor.

"Trata-se de recuperar o atraso acumulado e modernizar as vias férreas. O número de passageiros deverá aumentar de forma massiva nos próximos anos. O que obriga lançar novas obras e expandir a infraestrutura. A situação é idêntica para o transporte de mercadorias, um setor onde se preveem mudanças importantes", afirmou Torsten Westphal, Presidente do EVG, o sindicato dos Trabalhadores da Ferrovia e Transportes.

O governo alemão e a companhia férrea Deutsche Bahn decidiram investir 86 mil milhões de euros ao longo dos próximos dez anos para modernizar a rede ferroviária. "A ferrovia é apenas um dos setores que precisam de investimento público na Alemanha. Mas, os 86 mil milhões de euros são vistos como um primeiro passo que deverá permitir a criação de emprego, favorecer o frete ferroviário entre a Alemanha e os parceiros comerciais e estimular o crescimento.

Num contexto de emergência climática, o investimento na ferrovia poderá ter outra vantagem: diminuir as viagens de avião e as emissões de CO2.

euronews

Gentiloni defende alteração da política fiscal europeiaA Euronews entrevistou o novo comissário europeu para a economia. Paolo Gentiloni defende uma alteração da política fiscal dos 27.

euronews: Muito obrigado por estar connosco. Há um debate em torno da necessidade de reforma as regras europeias em matéria de fiscalidade? Porque razão é necessária essa reforma? O que está em causa?

Paolo Gentiloni: "Essas regras foram elaboradas no contexto da maior e mais perigosa crise económica europeia, após a segunda guerra mundial. Agora estamos num momento diferente. Houve seis anos de crescimento contínuo, mas ao mesmo tempo esse crescimento está a desacelerar. Não queremos uma revolução, mas penso que as regras devem ser adaptadas à nova situação em que nos encontramos".

euronews: "Essa mudança põe em causa os objetivos fiscais da UE?"

Paolo Gentiloni: "Não, não se trata de rediscutir os objetivos da política fiscal. Os objetivos fiscais estão nos nossos tratados, os célebres 3% e 60% não são algo que se possa mudar como quem muda de roupa. A ideia é ter três objetivos diferentes. Em primeiro lugar, tornar as regras mais simples, porque a cada anos que passa as regras são mais complexas. Em segundo lugar, devemos contribuir, numa fase de baixo crescimento, como a que vivemos hoje, para uma política fiscal mais expansionista. Em terceiro lugar, é preciso incentivar o investimento".

euronews: Atualmente, a Comissão Europeia tem o direito de forçar alguns governos a limitar a despesa, mas não tem o direito de os obrigar a gastar. É algo que deve mudar? Está pronto para convencer os mais irredutíveis a mudar de posição?

Paolo Gentiloni: Num contexto de crescimento muito baixo, como vivemos atualmente, a questão coloca-se mesmo nos países com excedente orçamental. A Comissão Europeia recomenda há vários anos, que esse excedente fiscal seja canalizado para o investimento. Esse estímulo ao investimento teria efeitos não apenas nos países em questão mas em toda a União Europeia.

Penso que vamos rever algumas cláusulas, nomeadamente em relação a uma certa flexibilidade para facilitar o investimento.
Paolo Gentiloni Comissário Europeu para a Economia

euronews: Pensa que os investimentos preconizados pelo pacto ecológico europeu devem ser excluídos do procedimento por défice excessivo?

Paolo Gentiloni: A ideia de exclusão é talvez uma forma simplista de descrever o caminho que estamos a seguir. Penso que vamos rever algumas cláusulas, nomeadamente em relação a uma certa flexibilidade para facilitar o investimento.

euronews: "Quando é que será possível, realisticamente, chegar um acordo sobre essa questão?"

Paolo Gentiloni: "Depois do verão, vamos tirar conclusões e apresentar propostas".

euronews: "Isso significa que haverá um compromisso entre os Estados-Membros para uma decisão final?"

Paolo Gentiloni: "Sim. Sem a criação de pontes, sem compromissos, não vamos a lado nenhum".

Últimos comentários

Divulgação de riscos: A realização de transações com instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve altos riscos, incluindo o risco de perda de uma parte ou da totalidade do valor do investimento, e pode não ser adequada para todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos tais como eventos financeiros, regulamentares ou políticos. A realização de transações com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir realizar transações com instrumentos financeiros ou criptomoedas, deve informar-se sobre os riscos e custos associados à realização de transações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente os seus objetivos de investimento, nível de experiência e nível de risco aceitável, e procurar aconselhamento profissional quando este é necessário.
A Fusion Media gostaria de recordar os seus utilizadores de que os dados contidos neste website não são necessariamente fornecidos em tempo real ou exatos. Os dados e preços apresentados neste website não são necessariamente fornecidos por quaisquer mercados ou bolsas de valores, mas podem ser fornecidos por formadores de mercados. Como tal, os preços podem não ser exatos e podem ser diferentes dos preços efetivos em determinados mercados, o que significa que os preços são indicativos e inapropriados para a realização de transações nos mercados. A Fusion Media e qualquer fornecedor dos dados contidos neste website não aceitam a imputação de responsabilidade por quaisquer perdas ou danos resultantes das transações realizadas pelos seus utilizadores, ou pela confiança que os seus utilizadores depositam nas informações contidas neste website.
É proibido usar, armazenar, reproduzir, mostrar, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos neste website sem a autorização prévia e explicitamente concedida por escrito pela Fusion Media e/ou pelo fornecedor de dados. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados pelos fornecedores e/ou pela bolsa de valores responsável pelo fornecimento dos dados contidos neste website.
A Fusion Media pode ser indemnizada pelos anunciantes publicitários apresentados neste website, com base na interação dos seus utilizadores com os anúncios publicitários ou com os anunciantes publicitários.
A versão em inglês deste acordo é a versão principal, a qual prevalece sempre que há qualquer discrepância entre a versão em inglês e a versão em português.
© 2007-2025 - Fusion Media Limited. Todos os direitos reservados.