Por Sergio Goncalves
LISBOA, 30 Jan (Reuters) - Os riscos do Brexit e a desaceleração dos emergentes estão a levar os investidores a adiar, mais seis meses do que o habitual, as decisões de investir em Portugal, mas o presidente da AICEP está optimista que o 'pipeline' de projectos permitirá bater novos recordes de investimento e exportações em 2019.
Luís Castro Henriques adiantou que, "sendo totalmente realista, nos últimos quatro meses, tem-se sentido que os processos de decisão de investimento até chegarem a uma candidatura, que antes demorariam um ano a 18 meses de 'namoro', estão agora a ter um acréscimo de mais seis meses".
O presidente da agência, que só angaria investimentos que tenham um relevante pendor exportador, afirmou que "há muitas empresas a dizer que os seus 'boards' estão convencidos, mas o ambiente internacional está uma confusão e portanto pedem mais tempo para pensar".
"Não é tanto para pensar se escolhem entre Portugal ou outro país, mas é para pensar se fazem ou não o investimento. Isso é uma núvem que temos de gerir", disse o presidente da AICEP, em entrevista à Reuters.
Realçou que "2019 vai ser um ano com muita 'poeira no ar': o mais óbvio é o Brexit - como, quando e com que consequências? -, e também o enquadramento mundial, com os emergentes a terem uma desaceleração grande com a queda dos preços das commodities".
"A única coisa que temos sentido é que o período de tomada de decisões dos investidores tem demorado mais, mas com a mesma taxa de concretização. Não vemos um abrandamento", disse.
"Portanto, o nosso 'outlook' para a actividade de angariação de investimento é optimista porque estamos a processar mais e melhor investimento pois temos, cada vez mais, projectos de elevadíssimo valor acrescentado e temos uma diversificação geográfica que é muito relevante".
Perguntado sobre se em 2019 pode ser batido um novo recorde disse: "Vou trabalhar para isso até ao final do ano, é para isso que estamos cá."
"Assim, vejo as exportações a subirem, vejo o PIB a crescer e vejo o investimento a vir para Portugal com uma componente inovadora e tecnológica cada vez maior e a criar cada vez mais postos de trabalho", afirmou Luís Castro Henriques.
ANO RECORDE
Em 2018, no décimo ano de vida da agência, o investimento produtivo angariado pela AICEP quase duplicou face a 2017 para um recorde de 1.149 milhões de euros (ME), com 49 projectos face a 29 um ano antes. O anterior recorde concretizado tinha sido de 1.086 ME em 2014, quando o país saiu de um duro resgate externo, consolidando as expectativas positivas dos investidores.
"Melhor notícia do que o recorde de contratualizações em 2018 é que ainda temos em 'pipeline' mais de 2.000 ME e portanto ainda há muito que trabalhar e há muita negociação a decorrer", afirmou, referindo que "os projectos estão sempre a entrar e o 'pipeline' está sempre a ser construído, é dinâmico".
O Investimento Directo Estrangeiro (IDE) pesou 62 pct do investimento angariado em 2018, enquanto o nacional foi 38 pct, "e o pipeline ainda tem mais pendor de IDE, à volta de 70 pct", disse.
Adiantou que a origem de IDE está mais diversificada, tendo em 2018 o Canadá liderado o ranking, suportado por um investimento de 256 ME da mineira Lundin Mining LUN.TO , seguindo-se os países habituais fortemente investidores como França e Espanha, mas também EUA, Japão ou Coreia do Sul. A Alemanha, que foi um dos líderes em 2017, desceu na listagem em 2018, mas segue em lugares cimeiros no 'pipeline'.
Os sectores que estão a atrair mais investimento são variados, desde a metalomecânica com destaque para a indústria automóvel e de componentes, passando pela extração mineira, pasta e papel, agro-alimentar, até novos serviços de engenharia e software com alto valor acrescentado.
Em 2018, o investimento para projectos de IDT-Investigação e Desenvolvimento Tecnológico aumentou 1,6 vezes para 80 ME. Desde 2015 até 2018, a AICEP angariou 204 ME de projectos de IDT, ou seja quase o mesmo valor do angariado em todo o QREN 2008-2014.
"Vamos seguramente aí bater o recorde até porque (o IDT) é uma linha onde temos uma diversificação muito grande de actividades e de clientes", disse, lembrando investimentos da Volkswagen AutoEuropa, PSA, Renault (PA:RENA), Bosch, Natixis, BMW (DE:BMWG) ou da norte-americana Amyris.
Os projectos contratualizados em 2018 criarão mais 4.300 postos de trabalho e "os projectos de IDT têm uma proporção relevante de doutorados e pós-doutorados".
Uma nova tendência dos investidores é privilegiarem os benefícios fiscais face aos financeiros, pois conseguem mais rápido aumentar a rentabilidade, mostrando que estes projectos, para além de altamente empregadores, retêm muito IRC no país.
EXPORTAR MAIS
O presidente da agência recordou que, entre 2007 e 2017, as exportações portuguesas tiveram a maior subida da sua história, crescendo 1,5 vezes para um recorde de 84.316 ME e as "empresas contratualmente apoiadas pela AICEP - para internacionalização, para investimento ou ambos - representou 46 pct desse aumento".
"O facto de termos feito uma contratualização recorde de investimento automaticamente vai ter um impacto de crescimento nas exportações", afirmou.
Segundo o INE, em Novembro as exportações caíram 8,7 pct, sobretudo devido à greve dos estivadores no porto de Setúbal, que bloqueou a saída de viaturas da AutoEuropa, mas nos 11 meses subiram 1 pct para 82.293 ME, encaminhando-se para novo máximo.
"Parece-nos um fenómeno conjuntural pois, pela informação que temos, as exportações irão continuar a crescer. O impacto grande foi no sector automóvel e a própria AutoEuropa também teve paragens por causa dos motores 'just in time'", disse.
Explicou que o aumento das exportações tem sido suportada por ganhos de quota, mas é preciso diversificar mais mercados, em especial em sectores tradicionais portugueses como textil e calçado, pois ainda há uma proporção de 3/4 intra-Europa.
Afirmou que os dados do QREN 2008-14 mostram que as empresas que permaneceram a exportar para apenas dois mercados aumentaram as exportações somente 18 pct, enquanto as que se mantiveram em mais de cinco mercados subiram-nas 38 pct.
"A chave para fazer esta diversificação das exportações é a atração de investimento", concluiu. (Por Sérgio Gonçalves Editado por Catarina Demony)